Relatos
Da Depressão
Vieram me falar que eu andei mórbido essa semana por conta dos meus poemas com uma levada mais sombria, mas esse era o objetivo mesmo, afinal, cansei já de dizer que sempre não é todo dia, então, não dá para ser alegre o tempo todo, ser feliz o tempo todo, estar bem o tempo todo.
Contudo, isso não quer dizer também que meus
pensamentos estavam destrutivos, que eu estou com tendências suicidas ou que eu
estou perdido no mundo, muito menos querendo tirar minha vida. Não, não tem
nada a ver isso, apenas me dei ao trabalho para falar sobre momentos que
passei, momentos que são tabus para muitas pessoas, mas que eu a cada dia vejo
que mais e mais pessoas encaram isso e não têm o devido apoio, tanto de pais,
irmãos e companheiros, como amigos, colegas, conhecidos...
Hoje me encontro forte
novamente, me sinto capaz de colocar para fora esses sentimentos de forma
coesa, sem que eles me tragam aquela sensação antiga que eles me traziam, na
época em que eu estive no fundo do poço, em que eu me vi abandonado, me vi
desamparado e me vi realmente sem saída, sem alternativas, sem quaisquer
perspectivas de mudar o que acontecia comigo.
Inicialmente, quero
deixar bem claro, não saí da condição de depressão sozinho. Não tinha nem como,
acho que ninguém sai sozinho disso, mas saí porque eu quis e isso eu acho que é
de responsabilidade única e exclusiva de cada pessoa. Assim, acredito que cada
um tem que decidir mudar a situação, tem que decidir sair do fundo do poço, tem
que tirar a cabeça da lama, tem que querer abandonar o estado de depressão.
Não, não é fácil você
sair da depressão, não é mesmo. Algumas coisas foram muito determinantes para
eu sair dessa situação, precisei ver que minha vida não estava indo no rumo que
eu desejava, tive que perder pessoas que eu amava, tive que me afastar de
coisas que me faziam mal, tive que mudar hábitos, tive que sair da minha zona
de conforto, tive que abrir mão do controle sobre a minha vida, mas acima de
tudo, tive que começar uma terapia com uma psicóloga, tive que buscar novos
hábitos, novas atitudes, novos desejos, precisei me reapaixonar pela vida.
Aí que está o principal
ponto. Quando encaramos um inimigo tão íntimo quanto nós mesmos, que é o que
traz a depressão, nós precisamos de toda a força do mundo, precisamos mesmo de
apoio, de pessoas que nos deem carinho, que estejam dispostas a nos fazer bem,
que mesmo que nós não queiramos ou não saibamos aceitar essa ajuda, que elas
não se frustrem ou não se sintam mal por isso, pois, quando você está nessa
condição, as coisas pioram muito e muito rápido, antes de começarem a melhorar
ou de você se dar conta disso.
Algo que me lembro desse
tempo, é que eu estava desmoronando e me sentia muito sozinho, sentia que não
podia contar com ninguém, que nada do que eu fizesse iria mudar o rumo da minha
vida. Era como se eu fosse um grande navio e estivesse navegando e encontro as
rochas, soubesse que isso ia acontecer que quando eu me chocasse com elas, tudo
acabaria, tudo iria por água abaixo, contudo eu não tinha forças para mover o
timão e me tirar de encontro as pedras.
Pouca gente sabe disso,
pouquíssimas pessoas me veem como alguém capaz de ter estado em depressão,
principalmente por me conhecerem e saberem que eu sou brincalhão, que sou um
cara que me valho tanto do humor e das piadas. Eu acabo mascarando alguns
sentimentos que tenho com piadas, acho que quase todos nós fomos doutrinados a
não demonstrarmos fraqueza, a parecermos sempre fortes, a mascararmos nossas
dores, pois assim as pessoas a nossa volta não se aproveitarão de nossas
desvantagens.
Ocorre que, isso é uma
tremenda besteira, nós precisamos sim demonstrar nossas fraquezas, conseguir
falar sobre nossos problemas ajuda e muito a equacioná-los, mesmo que não
consigamos ver a solução de imediato, só de não ficarmos com esse peso por
muito tempo sobre nossos ombros, isso já nos faz mal.
Outra coisa que me lembro
muito da época, é que além da dor mental, a dor física começou a surgir, passei
a ter muito mais problemas de saúde, minhas alergias pioraram, minha coluna
passou a doer, minha sinusite e enxaqueca começaram a me aterrorizar e nada ou
ninguém a minha volta conseguia me fazer enxergar que estava tudo ligado,
sempre era: - Mas você anda muito doente, hein. - Mas porque você não vai ao
médico ver isso? – Você tá precisando de uma reza forte.
Pois bem, ninguém na
verdade conseguia ver o problema maior, eu estava mal, mas não era a saúde
física, é a saúde mental. Muitos estudiosos já falaram que quando a mente fica
mal, ela usa o corpo para nos dar sinais de que precisamos fazer algo para isso
mudar. É como o caso da pessoa que se esforça muito e que em determinado
momento desmaia, pois, o corpo já não aguenta mais. É a mesma coisa quando você
entra em estado depressivo, o seu corpo começa a dar sinais de que você precisa
mudar isso, mas não é todo mundo que enxerga os sinais.
Eu demorei muito, comecei
a me fechar em mim, me afastei de amigos, da minha companheira, dos meus pais,
dos meus irmãos... O trabalho não me dava prazer, os estudos também não, as
metas que eu me colocava não me davam motivação... Estava deteriorando o que eu
era. Estava me transformando em algo diferente, em uma pessoa diferente em
alguém que eu nunca fui.
Poucos foram capazes de
notar, pois eu era como na história do “Il Pagliacci”: Um homem chega a essa
cidade e descobre que nela mora o melhor psicólogo do país, depois de já ter
tentando de tudo para resolver sua tristeza, ele resolve tentar com esse
médico, aí, ao consultório de um psicólogo e fala: - Doutor, o senhor precisa
me ajudar, estou muito triste. No que o médico responde: - Ah, mas porque o
senhor está tão triste? E o homem responde, não sei, mas estou muito triste,
não sei o porquê. O médico lhe fala: - Mas você já pensou em ir caminhar sob o
sol, ir ver os pássaros, correr na praia? No que o homem respondeu: - Doutor,
eu já fiz de tudo, estou chegando agora a cidade e não sei mais o que fazer. O
médico, então, do alto de sua sabedoria, vira para o homem e fala: - Olha,
chegou à cidade um grande artista, um palhaço sensacional, e não tem como
alguém ficar triste assistindo ao seu espetáculo. O que você precisa é isso,
uma boa sessão de risos assistindo a esse artista. Nesse momento o homem começa
a chorar e o médico pergunta: - O que houve, alguma coisa errada? E o pobre
homem responde: - Doutor, eu sou o palhaço.
Pois bem, pessoas que
tendem a ser o porto seguro de muitas pessoas também precisam do seu próprio porto
seguro. Como canso de falar, sempre não é todo dia, mesmo! Há dias em que nada
dá certo, em que não temos forças para seguir em frente, em que não conseguimos
ter motivação até para levantar da cama, e não precisamos estar depressivos
para que isso ocorra. Quando estamos depressivos, esses dias são praticamente uma
constante. E as pessoas não conseguem entender que nada muda isso, que a gente
apenas vai se deixando ir pra baixo, se afundando cada vez mais no nosso
mundinho ruim, nossas ideias começam a ficar cada vez mais turvas e
depressivas, e entramos numa espiral pra baixo.
Essa espiral começa a ser
uma coisa perigosa, pois passamos a esquecer as coisas que nos fazem bem, que
poderiam nos retirar dessa fase, mas não dá, a gente apenas se apega ao que é
constante, que é a dor. A gente só sente a dor, só pensa na dor, só vive a dor.
E a dor é impiedosa, a dor é inclemente, ela não tem dó alguma de você. Daí
você passa a viver em função dela, pensar nela, agir por ela...
Então chega um ponto
crítico para as pessoas com depressão, que é descobrir o que fazer com essa
dor. Alguns de nós acreditam que deve encarar de frente o problema, se tomam de
forças, lutam pela vida e segue em frente, enfrenta um longo caminho para sair
da situação, cheio de altos e baixos, com recaídas e tudo mais, mas que ainda
assim, vale a pena, pois vamos superar esse momento ruim. Para outros, a saída
é a fuga, é dar as costas para o mundo, é realmente você só ver uma saída, que
essa dor só vai acabar com a morte.
Nunca falei sobre isso
antes, mas hoje me sinto forte o suficiente para tratar disso, sem que eu me
coloque como alguém fraco ou como alguém que não se importa e tal. Pois bem, não
tenho estudos estatísticos, muito menos conhecimento científico da coisa,
então, só posso falar de mim, eu tive pensamentos suicidas, tive ideias de
acabar com a minha própria existência sim, acho que é comum, você pegar e
pensar como seria o mundo sem você, como seria diferente a vida das pessoas se
você desse fim aquela sua dor.
Eu, por conta de minha
doutrinação católica, consegui tirar todos esses pensamentos de minha mente
sempre que eles surgiam, mas ao passar por essa problemática, pude entender
mais quando as pessoas estão em tamanho grau de desespero e desamparo, que só conseguem
ver isso como saída. Por isso mesmo, me preocupo tanto com as pessoas a minha
volta quando elas estão pra baixo. Sei o que tal doença é capaz de fazer com
você, principalmente quando você não sente apoio de ninguém, de parte alguma.
Tenho alguns amigos que
estão passando por tal situação e busco falar com eles todos os dias, busco
saber como eles estão, compartilhar minha experiência, essas coisas. Acho que
todo mundo sabe que ninguém é uma ilha, por isso mesmo, precisamos de ajuda,
precisamos de apoio, precisamos de carinho. Têm gente que em alguns momentos só
precisa de colo, de que alguém enxugue suas lágrimas, que alguém apenas esteja
lá.
Eu me coloco hoje para
esses meus amigos, mas ainda tenho os meus dramas pessoais, ainda têm dias que
me sinto sozinho, ainda têm dias que estou pra baixo, ainda têm dias que não
tenho forças, disposição ou vontade, mas hoje, sei que esses dias vão passar,
hoje eu vejo esses dias não mais como comum, mas dias que me servem para valorizar
os dias que não são assim, os dias que estou bem, que estou feliz, que estou
motivado, que estou com a mente livre, que estou contente, que estou em busca
da minha felicidade.
Ainda falta muita coisa
para eu ser feliz, faltam coisas que eu quero completar nessa vida, ainda penso
em construir muitas coisas, estou compondo novos objetivos, estou batalhando
por uma vida melhor, mais contente, em que eu consiga ficar na paz interior e
exterior, em que eu deixe de me assustar com a força do meu pior inimigo, mas
acima de tudo, dias em que eu volte a ser eu por completo. Sei que pouca gente
conseguirá compreender o que é pra mim poder estar falando sobre isso assim
abertamente, mas pra mim, essa é a melhor terapia, por pra fora todos os tipos
de sentimentos, os que valem apena eu sentir e os que eu não quero nunca mais
sentir. Mas de qualquer forma, eu estou em recuperação e me sinto hoje forte o
suficiente para poder olhar para trás, ver o que eu passei e poder falar: Eu
consegui vencer essa batalha, ainda não venci a guerra, mas estou no caminho
certo.
PS: Dedico esse texto a todos os meus amigos, conhecidos ou apenas leitores que estão passando por esse problema hoje em dia e me serviram de motivação para escrever sobre esse momento que foi tão ruim da minha história, mas que felizmente está no passado e espero que não volte nunca mais.
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