Conto De Fadas Carioca
Ela nasceu no asfalto fervilhante da
Delfim Moreira
Eu nasci entre becos e vielas do Vidigal
Crescemos em mundos opostos
Eu brincando com os pés no chão pela
favela
Ela indo curtir o Mickey na Disney
Cada um com seu cada qual. Nascidos sob a
mesma lua na Cidade Maravilhosa.
O pai dela, doutor renomado cheio da grana
Meu pai, eu nem sei quem é
Ela foi criada com tudo do bom e do melhor
Eu fui criado com amor e o que tivesse
Mas o mundo dá voltas, parceiro
Quem diria que a gente um dia ia se
encontrar?
Quem iria dizer que a gente ia acabar se
apaixonando?
Eu, negão. Ela, branquinha.
Eu só uso o cabelo black. Ela só gosta de
andar bem penteada.
Eu trabalho e estudo para buscar uma vida
melhor
Ela estuda na PUC e ganhou um carro de
presente
Mas a vida quis assim: uma história de
amor bem carioca
O plebeu preto, pobre e favelado.
E a princesa aristocrata, filha de magnata.
Mas o nosso romance é real e verdadeiro
Nasceu de um encontro por acaso no Samba
da Cobal
Ela cercada de amigas e eu com os
camaradas
Acabamos nos trombando meio sem querer
Ela derrubou a cerveja em mim e se
desculpou
Eu chamei ela pra dançar e ela gostou do
meu sorriso
Passamos a noite toda nos curtindo
Mesmo com a cara feia das amigas dela e as
risadas dos meus amigos
Trocamos telefones e marcamos de nos
encontrar de novo
Ela chegou com o motorista no Shopping
Leblon
O meu busão parou logo ao lado da entrada
Fomos até a Travessa, gastei meu
conhecimento de literatura
Falei de Neruda e Drummond, ela ficou
impressionada
Os seguranças ressabiados com o negão de
mão dada com a loirinha
Na hora de ir embora, ela pediu uma carona
Falei que eu ia custar caro, pois o busão
agora é 4 e 10
Ela topou a aventura, saltou no último
ponto antes da Niemayer
Descemos e caminhei até a porta do prédio
dela
O porteiro chamou os seguranças, falou que
era assalto
Os policiais chegaram e já iam me levando
no carro para averiguação
É complicado ser preto, pobre e namorar
filha de bacana
Ela falou que era só o seu namorado e todo
mundo ficou de cara
Me liberaram das algemas, me tiraram da
traseira do carro
Eu todo sem graça, fui agradecer a ela. E
ela se desculpou
Falou que não entendia como isso ainda
acontecia
Eu falei que isso era mais comum do que
ela podia imaginar
Já fazem três anos desse dia e hoje
estamos juntos ainda
Mais um dia dos namorados para comemorar
Juntei um dinheiro e vou levar ela pra
jantar
Vai ser lá no Bar do Arvrão, na minha
comunidade
Vista pro mar do Leblon e da cobertura onde
ela mora
É só mais uma história de amor dessas que
acontecem
Sob os braços do Redentor, com bênçãos aos
apaixonados
Felizes para sempre em um conto de fadas
carioca