Amor De Cão
Caminho pela noite escura sob a lua da
Guanabara
Observando o ônibus que vem ao longe em
minha direção
Noto que a presença da insegurança é
constante aqui
Estou há quase uma hora esperando o ônibus
chegar
É complicado sair da zona sul e chegar ao
Recreio de madrugada
São menos de 50 quilômetros, mas uma
jornada essa hora da noite
Vejo a movimentação das mulheres na
avenida Vieira Souto
Carros e motos param apressados e
conversam com as moças
No quiosque em frente, pessoas animadas
tomam um chope
É inverno, mas aqui é Rio de Janeiro, né?
O calor tá matando
Vejo as luzes dos cigarros acesos na pedra
do Arpoador
Jovens e adultos se alternam num baforar
constante
Um casal se beija freneticamente rolando
na areia da praia
Os surfistas se jogam no mar como se não
houvesse amanhã
Restaurantes lotados de pessoas que
esticaram a happy hour
Muitas gargalhadas, muita gritaria, muita
diversão
Fixo o olhar ao longe, em um catador de
latinhas e seu carrinho
Quando virou a rua, pensei até que fosse
um caminhão
Mas era só uma carrocinha de catador
iluminada e superlotada
O homem com sorriso no rosto, olhando lata
por lata em seu caminho
Quando ele para em uma lata em frente ao
hotel mais caro
Um carro de luxo cheio de rapazes bêbados
passa devagar ao seu lado
Os endinheirados jogam bebidas e restos de
comida no catador
O homem se resigna e apanha os restos do
chão
A sua cara é de quem não come há muito
tempo, pelo menos há um dia
O coitado se levanta e coloca a comida em
sua carroça
Na mesma hora ele dá um assobio e aparece
um cachorro do meio das latas
O vira-lata late e parece muito feliz
O rosto do homem se alegra quando o animal
lhe lambe o rosto
Parece que há mais humanidade no cachorro
do que nos homens do carro
Na porta do bar da esquina, um homem
assiste a cena emocionado
Saía de um jantar com a namorada,
carregando uma quentinha
Quando o catador vai passando por ele, o
homem lhe entrega a quentinha
O catador para, agradece ao homem e senta
para comer
Não sem antes dividir mais um pouco de alimento
com o seu cão
Uma cena tipicamente carioca:
Um catador e seu cãopanheiro pela
madrugada
Um homem que reparte o pouco que tem
E um outro que sabe abrir mão do que não
vai precisar
Meu ônibus chega, subo nele e me encaminho
para a minha casa
Cruzo com o catador brincando com o seu
amigo cão
A felicidade dos dois está mais do que
evidente
E mais uma vez, a noite sob a lua de
Ipanema me dá uma lição
Me mostra que o amor é feito para quem
sabe amar
Mesmo que você só tenha o amor de um cão
Show
ResponderExcluir