quinta-feira, 13 de junho de 2019

Amor De Cão


Amor De Cão

Caminho pela noite escura sob a lua da Guanabara
Observando o ônibus que vem ao longe em minha direção
Noto que a presença da insegurança é constante aqui
Estou há quase uma hora esperando o ônibus chegar
É complicado sair da zona sul e chegar ao Recreio de madrugada
São menos de 50 quilômetros, mas uma jornada essa hora da noite
Vejo a movimentação das mulheres na avenida Vieira Souto
Carros e motos param apressados e conversam com as moças
No quiosque em frente, pessoas animadas tomam um chope
É inverno, mas aqui é Rio de Janeiro, né? O calor tá matando
Vejo as luzes dos cigarros acesos na pedra do Arpoador
Jovens e adultos se alternam num baforar constante
Um casal se beija freneticamente rolando na areia da praia
Os surfistas se jogam no mar como se não houvesse amanhã
Restaurantes lotados de pessoas que esticaram a happy hour
Muitas gargalhadas, muita gritaria, muita diversão
Fixo o olhar ao longe, em um catador de latinhas e seu carrinho
Quando virou a rua, pensei até que fosse um caminhão
Mas era só uma carrocinha de catador iluminada e superlotada
O homem com sorriso no rosto, olhando lata por lata em seu caminho
Quando ele para em uma lata em frente ao hotel mais caro
Um carro de luxo cheio de rapazes bêbados passa devagar ao seu lado
Os endinheirados jogam bebidas e restos de comida no catador
O homem se resigna e apanha os restos do chão
A sua cara é de quem não come há muito tempo, pelo menos há um dia
O coitado se levanta e coloca a comida em sua carroça
Na mesma hora ele dá um assobio e aparece um cachorro do meio das latas
O vira-lata late e parece muito feliz
O rosto do homem se alegra quando o animal lhe lambe o rosto
Parece que há mais humanidade no cachorro do que nos homens do carro
Na porta do bar da esquina, um homem assiste a cena emocionado
Saía de um jantar com a namorada, carregando uma quentinha
Quando o catador vai passando por ele, o homem lhe entrega a quentinha
O catador para, agradece ao homem e senta para comer
Não sem antes dividir mais um pouco de alimento com o seu cão
Uma cena tipicamente carioca:
Um catador e seu cãopanheiro pela madrugada
Um homem que reparte o pouco que tem
E um outro que sabe abrir mão do que não vai precisar
Meu ônibus chega, subo nele e me encaminho para a minha casa
Cruzo com o catador brincando com o seu amigo cão
A felicidade dos dois está mais do que evidente
E mais uma vez, a noite sob a lua de Ipanema me dá uma lição
Me mostra que o amor é feito para quem sabe amar
Mesmo que você só tenha o amor de um cão

Um comentário: