quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

A Ironia Do Destino

A Ironia Do Destino

Tão estranho como o giro do mundo nos faz perceber o quão insignificante nós somos. Nós somos poeira perto da grande engrenagem que o Criador tem nas mãos e influi sobre nós. Nos esforçamos, lutamos, buscamos o melhor, damos o nosso máximo, fazemos por onde, tentamos diversas coisas para mudar o destino, fazer o mundo mais adequado para nós, mas no fim das contas, é só o destino, o grande soberano. Já cansei de dizer que somos senhores do nosso destino e tudo mais, que nada e nem ninguém é capaz de mudar isso, exceto pelo próprio destino, que é implacável.
Toda vez que me deparo com acontecimentos bizarramente estranhas assim, me vem logo a música “Ironic” da Alanis Morissete, que trata justamente disso, das ironias do destino. Alanis foi feliz em tratar de pequenas ironias do destino, como um idoso de 98 anos ganhar na loteria e morrer no dia seguinte, chover no dia do seu casamento, ou ainda conhecer o grande amor da sua vida e conhecer junto a linda esposa dele... Em todos os casos que ela retrata, impressiona a ironia com a qual o destino age. Mas tais situações se tornam ainda mais irônicas quando são reais, quando conseguimos perceber tudo isso na nossa realidade ou em nossa vivência terrena. São acontecimentos tão bizarros e irrisórias, que parecem dignas de filmes, novelas ou filmes de ficção, mas aconteceram de forma real, com pessoas reais e nos trouxe o sentimento de impotência e fatalidade diante dessa ironia.
Explico aqui porque de achar tudo isso uma grande ironia. A Chapecoense é um time pequeno do estado de Santa Catarina, que foi fundado em 1973, ou seja, não tem nem 50 anos, contudo, com investimento correto e muita competência, alcançou, desde 2009, acesso as divisões superiores, chegando em 2014 até a série A e embora, sempre sendo apontada como um virtual candidato ao rebaixamento, conseguiu alcançar o seu lugar na elite do futebol brasileiro.
Se nos anos anteriores, tinha tido campanhas para a fugir do rebaixamento, nesse ano, a Chape foi mais, conseguiu estar na primeira página da tabela de classificação, além de começar a traçar uma grande história internacional, chegando, com muita luta e muita garra, a final da Taça Sul-Americana, um torneio com muitos dos principais times sul-americanos.
Nesta quarta, dia 30 de novembro de 2016, a Chapecoense estaria entrando em campo para colocar seu nome na história, como o primeiro time do interior brasileiro a fazer uma final de torneio internacional. A cidade de Chapecó, uma cidade de pouco mais de 220 mil pessoas, conseguiu se unir em torno do seu time e abraçou esses homens, para que os mesmos fossem para a Colômbia para conseguir escrever seu nome na história com uma conquista inédita, contudo, quis o destino ser irônico, afinal, era o momento maior da história do clube, que acabou ficando em segundo plano. Esse acidente, com o time com o time da Chapecoense e os profissionais da imprensa em solo colombiano é bem isso, afinal, o time realmente estava a ponto de fazer história, com uma conquista inédita para eles, contudo, por conta da ironia do destino, eles passarão a história, pela tragédia e não pelo seu desempenho esportivo, que era e sempre foi o seu objetivo.
Paul Walker foi outro que sofreu na mão do destino, afinal, seu papel mais famoso era de um corredor de corridas clandestinas de carro, e sendo um aficionado por carros, colecionava-os e ainda dirigia com maestria, mas quis o destino que o mesmo morresse em um acidente de carro, sentado no banco de carona do mesmo, sem poder fazer nada. Outra ironia foi o acidente que vitimou o comandante Rolim, antigo dono da TAM, que embora um excelente piloto de avião, morreu em um acidente de helicóptero. Ou ainda, o caso dos Mamonas Assassinas, que dominaram a música no Brasil em 1995, com o seu primeiro e única cd de carreira, lotando shows e levando a audiência a loucura aonde quer que passassem, contudo, morreram ao final do último show da sua turnê nacional e que estava indo iniciar uma carreira internacional, mas que também perderam a sua vida em um acidente aéreo, encerrando um ano mágico onde eles conquistaram o Brasil.
Existem casos não fatais, mas que nem por isso, menos irônicos, como por exemplo, o caso da deputada federal que durante o seu voto pró-impeachment, rogou a Deus para ver o nosso país livre da corrupção e no dia seguinte viu o seu pedido ser atendido, com a prisão do seu marido por uma ação da PF para debelar a corrupção em nosso país. Ou ainda o pastor goiano que gritava contra os homossexuais, mas que foi pego tendo relação de sexo oral em outro homem dentro de seu carro, por policiais de Goiás. Isso tudo é o destino mostrando a sua ironia na sua máxima essência.
Perceba que falo em ironia e não em graça, até porque, esses episódios não têm nada de engraçados. Os fatos aqui ditos foram, todos eles, muito trágicos, mas ainda assim, de uma fina ironia. A fatalidade deles nos faz perceber o quanto é frágil, a nossa presença nesse plano e o quanto casualidades podem levar a casos como esses. Por exemplo, no caso do acidente da Chapecoense fica ainda mais fácil de verificar isso, haja vista que acontecimentos os levaram até a essa final.
Restará assim, então, o sentimento imponderável e inconsolável do “E Se”, onde restará para sempre a dúvida de se tudo isso estava predestinado ou se a soma de fatores aleatórios é que nos levou a essa tragédia. E se aquele gol não tivesse acontecido contra o São Lourenço; E se o jogo contra o Palmeiras tivesse acontecido com o mando de campo invertido; E se o voo fretado fosse de outra companhia; E se a viagem fosse em outro dia; E se o jogo tivesse outra data, outro horário; E se... Mas a verdade é que tudo isso não passa de especulações, de uma tentativa de dar sentido ao que não tem sentido, dará razão ao que não tem razão.
Sendo sincero, as vidas se esvaíram por conta de diversos fatores, alheios aos que se foram e aos que ficaram. Não foi só o time, tivemos os repórteres, a tripulação, os convidados, os dirigentes... E todas essas vidas interrompidas, em sua maioria em seu melhor momento na vida. Mas a dor dos que se foram não supera a dor dos que ficam. Eram pais, filhos, esposos, irmãos, netos, parentes, amigos e entes nossos que não irão retornar da busca de um sonho, que não poderão mais fazer algo histórico, pois de uma forma trágica, entraram para a História.
Ficam as boas lembranças, os bons sentimentos, os bons momentos, ficam o grito de gol, a bela jogada, as comemorações, as vitórias suadas, as derrotas sofridas, ficam os títulos, as conquistas, a superação, a narração empolgante, o comentário bem feito, a análise correta, a bela imagem feita, o furo de reportagem, a contratação de impacto, a substituição que deu resultado, o ótimo preparo físico, o grande trabalho realizado, por todos, os profissionais que se foram, mas além disso, fica o beijo de boa noite, o abraço apertado, o sorriso, o carinho, a voz, o toque, o eu te amo que foi dito, a presença, pois ali, ainda tinha também, além dos profissionais, tínhamos os seres humanos, aqueles que se foram e não voltarão mais, aqueles que não eram os ídolos, não eram os grandes personagens da torcida, mas sim o herói da casa, não era o fenômeno do jornalismo, mas o bom filho, não era o piloto, era o homem.
Não, a perda do futebol não foi pequena, foi enorme. Não se trata apenas de mais um jogo, são emoções, sentimentos esses capazes de transformar adultos em crianças, choro em alegria, silêncio em explosão de sons, contudo, quando perdemos tantas vidas, não é só o atleta que se vai, se vai o ser humano. Relembrando assim, que o herói é de carne e osso, que o cara na televisão também está sujeito as mesmas fatalidades que nós, meros mortais. Mesmo que muitas vezes a gente se esqueça disso e não consiga dissociar a imagem da tv do ser humano normal, que paga contas, que tem seus compromissos familiares, que sangra, chora e sofre como nós.
O destino foi mega irônico na madrugada de segunda para terça, quis de qualquer jeito que de todas aquelas 81 pessoas que estavam naquele voo fizessem história. Alguns sobrevivendo, outros perdendo a vida, contudo, todos eles sendo tragicamente elevados do anonimato para a eternidade com o título de campeões do povo, daqueles que lutaram, honraram, emocionaram e comoveram a nação. Não é pelo futebol, pelo esporte, é pelo que eles representam. É pelo filho, o pai, o avô, pela mãe, pela esposa, a avó, pelos netos, pelos amigos, pelos companheiros de time, pelos torcedores, pelos telespectadores, os ouvintes, pelos colegas de trabalho, por todos que choram, mas acima de tudo, é por todos aqueles que sentiram essa tragédia. Por tudo isso, digo e repito, o destino resolveu ser irônico, mas no momento em que seria feito algo histórico, tais acontecimentos tornaram tudo isso em HISTÓRIA.

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