A
Ironia Do Destino
Tão estranho como o giro
do mundo nos faz perceber o quão insignificante nós somos. Nós somos poeira
perto da grande engrenagem que o Criador tem nas mãos e influi sobre nós. Nos
esforçamos, lutamos, buscamos o melhor, damos o nosso máximo, fazemos por onde,
tentamos diversas coisas para mudar o destino, fazer o mundo mais adequado para
nós, mas no fim das contas, é só o destino, o grande soberano. Já cansei de
dizer que somos senhores do nosso destino e tudo mais, que nada e nem ninguém é
capaz de mudar isso, exceto pelo próprio destino, que é implacável.
Toda vez que me deparo
com acontecimentos bizarramente estranhas assim, me vem logo a música “Ironic”
da Alanis Morissete, que trata justamente disso, das ironias do destino. Alanis
foi feliz em tratar de pequenas ironias do destino, como um idoso de 98 anos
ganhar na loteria e morrer no dia seguinte, chover no dia do seu casamento, ou
ainda conhecer o grande amor da sua vida e conhecer junto a linda esposa
dele... Em todos os casos que ela retrata, impressiona a ironia com a qual o
destino age. Mas tais situações se tornam ainda mais irônicas quando são reais,
quando conseguimos perceber tudo isso na nossa realidade ou em nossa vivência
terrena. São acontecimentos tão bizarros e irrisórias, que parecem dignas de
filmes, novelas ou filmes de ficção, mas aconteceram de forma real, com pessoas
reais e nos trouxe o sentimento de impotência e fatalidade diante dessa ironia.
Explico aqui porque de
achar tudo isso uma grande ironia. A Chapecoense é um time pequeno do estado de
Santa Catarina, que foi fundado em 1973, ou seja, não tem nem 50 anos, contudo,
com investimento correto e muita competência, alcançou, desde 2009, acesso as
divisões superiores, chegando em 2014 até a série A e embora, sempre sendo
apontada como um virtual candidato ao rebaixamento, conseguiu alcançar o seu
lugar na elite do futebol brasileiro.
Se nos anos anteriores,
tinha tido campanhas para a fugir do rebaixamento, nesse ano, a Chape foi mais,
conseguiu estar na primeira página da tabela de classificação, além de começar
a traçar uma grande história internacional, chegando, com muita luta e muita
garra, a final da Taça Sul-Americana, um torneio com muitos dos principais
times sul-americanos.
Nesta quarta, dia 30 de
novembro de 2016, a Chapecoense estaria entrando em campo para colocar seu nome
na história, como o primeiro time do interior brasileiro a fazer uma final de
torneio internacional. A cidade de Chapecó, uma cidade de pouco mais de 220 mil
pessoas, conseguiu se unir em torno do seu time e abraçou esses homens, para
que os mesmos fossem para a Colômbia para conseguir escrever seu nome na história
com uma conquista inédita, contudo, quis o destino ser irônico, afinal, era o
momento maior da história do clube, que acabou ficando em segundo plano. Esse
acidente, com o time com o time da Chapecoense e os profissionais da imprensa
em solo colombiano é bem isso, afinal, o time realmente estava a ponto de fazer
história, com uma conquista inédita para eles, contudo, por conta da ironia do
destino, eles passarão a história, pela tragédia e não pelo seu desempenho
esportivo, que era e sempre foi o seu objetivo.
Paul Walker foi outro que
sofreu na mão do destino, afinal, seu papel mais famoso era de um corredor de
corridas clandestinas de carro, e sendo um aficionado por carros, colecionava-os
e ainda dirigia com maestria, mas quis o destino que o mesmo morresse em um
acidente de carro, sentado no banco de carona do mesmo, sem poder fazer nada.
Outra ironia foi o acidente que vitimou o comandante Rolim, antigo dono da TAM,
que embora um excelente piloto de avião, morreu em um acidente de helicóptero.
Ou ainda, o caso dos Mamonas Assassinas, que dominaram a música no Brasil em
1995, com o seu primeiro e única cd de carreira, lotando shows e levando a audiência
a loucura aonde quer que passassem, contudo, morreram ao final do último show
da sua turnê nacional e que estava indo iniciar uma carreira internacional, mas
que também perderam a sua vida em um acidente aéreo, encerrando um ano mágico
onde eles conquistaram o Brasil.
Existem casos não fatais,
mas que nem por isso, menos irônicos, como por exemplo, o caso da deputada
federal que durante o seu voto pró-impeachment, rogou a Deus para ver o nosso
país livre da corrupção e no dia seguinte viu o seu pedido ser atendido, com a
prisão do seu marido por uma ação da PF para debelar a corrupção em nosso país.
Ou ainda o pastor goiano que gritava contra os homossexuais, mas que foi pego
tendo relação de sexo oral em outro homem dentro de seu carro, por policiais de
Goiás. Isso tudo é o destino mostrando a sua ironia na sua máxima essência.
Perceba que falo em
ironia e não em graça, até porque, esses episódios não têm nada de engraçados.
Os fatos aqui ditos foram, todos eles, muito trágicos, mas ainda assim, de uma
fina ironia. A fatalidade deles nos faz perceber o quanto é frágil, a nossa
presença nesse plano e o quanto casualidades podem levar a casos como esses.
Por exemplo, no caso do acidente da Chapecoense fica ainda mais fácil de
verificar isso, haja vista que acontecimentos os levaram até a essa final.
Restará assim, então, o
sentimento imponderável e inconsolável do “E Se”, onde restará para sempre a
dúvida de se tudo isso estava predestinado ou se a soma de fatores aleatórios é
que nos levou a essa tragédia. E se aquele gol não tivesse acontecido contra o
São Lourenço; E se o jogo contra o Palmeiras tivesse acontecido com o mando de
campo invertido; E se o voo fretado fosse de outra companhia; E se a viagem
fosse em outro dia; E se o jogo tivesse outra data, outro horário; E se... Mas
a verdade é que tudo isso não passa de especulações, de uma tentativa de dar
sentido ao que não tem sentido, dará razão ao que não tem razão.
Sendo sincero, as vidas
se esvaíram por conta de diversos fatores, alheios aos que se foram e aos que
ficaram. Não foi só o time, tivemos os repórteres, a tripulação, os convidados,
os dirigentes... E todas essas vidas interrompidas, em sua maioria em seu
melhor momento na vida. Mas a dor dos que se foram não supera a dor dos que ficam.
Eram pais, filhos, esposos, irmãos, netos, parentes, amigos e entes nossos que
não irão retornar da busca de um sonho, que não poderão mais fazer algo
histórico, pois de uma forma trágica, entraram para a História.
Ficam as boas lembranças,
os bons sentimentos, os bons momentos, ficam o grito de gol, a bela jogada, as
comemorações, as vitórias suadas, as derrotas sofridas, ficam os títulos, as
conquistas, a superação, a narração empolgante, o comentário bem feito, a
análise correta, a bela imagem feita, o furo de reportagem, a contratação de
impacto, a substituição que deu resultado, o ótimo preparo físico, o grande
trabalho realizado, por todos, os profissionais que se foram, mas além disso,
fica o beijo de boa noite, o abraço apertado, o sorriso, o carinho, a voz, o
toque, o eu te amo que foi dito, a presença, pois ali, ainda tinha também, além
dos profissionais, tínhamos os seres humanos, aqueles que se foram e não
voltarão mais, aqueles que não eram os ídolos, não eram os grandes personagens
da torcida, mas sim o herói da casa, não era o fenômeno do jornalismo, mas o
bom filho, não era o piloto, era o homem.
Não, a perda do futebol
não foi pequena, foi enorme. Não se trata apenas de mais um jogo, são emoções,
sentimentos esses capazes de transformar adultos em crianças, choro em alegria,
silêncio em explosão de sons, contudo, quando perdemos tantas vidas, não é só o
atleta que se vai, se vai o ser humano. Relembrando assim, que o herói é de
carne e osso, que o cara na televisão também está sujeito as mesmas fatalidades
que nós, meros mortais. Mesmo que muitas vezes a gente se esqueça disso e não
consiga dissociar a imagem da tv do ser humano normal, que paga contas, que tem
seus compromissos familiares, que sangra, chora e sofre como nós.
O destino foi mega
irônico na madrugada de segunda para terça, quis de qualquer jeito que de todas
aquelas 81 pessoas que estavam naquele voo fizessem história. Alguns
sobrevivendo, outros perdendo a vida, contudo, todos eles sendo tragicamente
elevados do anonimato para a eternidade com o título de campeões do povo,
daqueles que lutaram, honraram, emocionaram e comoveram a nação. Não é pelo
futebol, pelo esporte, é pelo que eles representam. É pelo filho, o pai, o avô,
pela mãe, pela esposa, a avó, pelos netos, pelos amigos, pelos companheiros de
time, pelos torcedores, pelos telespectadores, os ouvintes, pelos colegas de
trabalho, por todos que choram, mas acima de tudo, é por todos aqueles que
sentiram essa tragédia. Por tudo isso, digo e repito, o destino resolveu ser
irônico, mas no momento em que seria feito algo histórico, tais acontecimentos
tornaram tudo isso em HISTÓRIA.
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